Dois homens viajavam juntos em pleno sol de verão. Eles iam
aonde vão os peregrinos perpétuos: sempre em frente. Perto do meio dia,
depois de caminhar muito desde o amanhecer, resolveram parar para comer
e descansar à sombra de um grande carvalho, à beira de uma campina.
Almoçaram um pedaço de pão e um copo de vinho. Depois um deles se
estendeu sobre a relva, com o chapéu sobre os olhos, as mãos cruzadas
sobre o ventre e dormiu.
Então, de dentro de sua boca aberta, seu companheiro viu
sair uma borboleta azul. Voando em círculos crescentes a borboleta foi
visitando arbustos e flores, até se dirigir para um crânio de cavalo que
estava sobre a relva, a certa distância dali.
O homem sentado não perdeu um só dos movimentos da
borboleta, que entrava e saía mil vezes daquele crânio, entrando por um
olho, saindo pelo outro, depois desaparecendo no fundo das órbitas para
reaparecer por entre os dentes, em rápidos volteios incessantes, até
finalmente afastar-se e voltar outra vez a voar em círculos em torno da
cabeça do homem que dormia e entrar pela sua boca adentro. Nesse momento
o homem acordou, esfregou os olhos e disse para o amigo enquanto se
espreguiçava longamente:
Acabo de ter um sonho muito agradável. Eu estava em um
palácio magnífico, brilhante, maravilhoso. Eu visitava todos os seus
aposentos, corria ao longo dos corredores, subia em seus andares mais
altos que tinham o teto abobadado como as igrejas, depois descia a seus
porões profundos. Este palácio era meu. E eu estava maravilhado porque
ele tinha sido construído sobre um imenso tesouro escondido sob suas
muralhas.
Foi então que o outro lhe respondeu:
- Você quer que eu diga onde é que você esteve durante seu
sono? Está vendo aquele crânio de cavalo que está brilhando ao sol? Foi
para lá que você foi. Eu vi seu espírito sair pela sua boca na forma de
uma borboleta azul. Ela visitou todos os lugares daquele crânio, do
fundo do olho até os dentes e depois voltou para dentro da sua boca.
Agora, se você quiser acreditar em mim, vamos fazer um buraco sob as
muralhas deste palácio, para ver se o olho do sonho é mesmo
clarividente.
Eles levantaram o crânio, cavaram a terra onde ele estava
depositado e descobriram o tesouro escondido. Um imenso tesouro: lá
havia TUDO, tudo o que um homem pode sonhar.